sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Dr. Eduardo Gross - coordenador do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Religião da Universidade Federal de Juiz de Fora, MG

À Reitoria da USJ
Conforme solicitação do professor Diógenes Ramos, apresento aqui algumas observações relativas à importância do estudo acadêmico da religião, tarefa na qual estou empenhado assim como os docentes do curso de Ciências da Religião desta universidade.
No Brasil, o estudo acadêmico da religião foi um tabu, até há pouco tempo. Infelizmente, resquícios disso, infelizmente, continuam presentes em nosso meio. Entendo que isto se deve a dois fatores complementares. De um lado, à mentalidade positivista redutora que dominou o cenário acadêmico, de outro a uma divisão de trabalho que outorgou o estudo da religião a detentores de poder nas instituições religiosas. Não é desejável que esta situação se mantenha, no que diz respeito a uma esfera de conhecimento que lida com um aspecto vivencial generalizado na sociedade. Os estudos de ciências da religião tem, nesse sentido, uma tarefa fundamental, não só ao tratar de um tema importante, mas também ao questionar uma forma míope de enxergar o que seja ou não digno de figurar nos estudos e pesquisas acadêmicos.
Cursos de ciências da religião começaram a surgir na Europa na virada do século XIX para o século XX. Nasceram como cursos independentes de confessionalidade e com a preocupação de estudar um aspecto da vida humana que se apresenta multifacetado, de acordo com a cultura em que se encontra, mas simultaneamente mostrado características que permitem comparações e analogias entre estas manifestações particulares. Até hoje, uma grande parcela de universidades renomadas contam com cursos de Ciências da Religião. A nomenclatura destes cursos varia, de acordo com os países, entretanto. "Religionswissenschaft" (Ciência da Religião) é o nome comum na Alemanha, com correlatos nas demais culturas de línguas germânicas; "Sciences Religieuses" (Ciências religiosas) é o nome comum na França, embora também se encontre "Sciences des Religions" (Ciências das religiões); nos países anglo-saxônicos, o mais comum é o termo "Religious Studies" (estudos religiosos), ma
s também se deveria citar os cursos das "Divinity Schools", já que alguns tem um caráter teológico mas outros não tem caráter confessional.
No Brasil há hoje cursos de Ciência(s) da(s) Religião(ões) em diversas universidades. Inicialmente surgiram os programas de pós-graduação, que estão hoje nas seguintes universidades: Universidade Federal de Juiz de Fora, Universidade Federal da Paraíba, Universidade Metodista de São Paulo, Universidade Católica de Goiás, Universidade Católica de Pernambuco, PUC-MG, PUC-SP e Universidade Presbiteriana Mackenzie. Como toda área acadêmica, estes programas apresentam peculiaridades teóricas, inclusive manifestadas no nome dos programas. Mas todos se caracterizam pela busca de um conhecimento profundo e isento da religião. Simultaneamente, representam um avanço fundamental para o desenvolvimento da pesquisa sobre o assunto.
Mais recentemente surgiram inúmeros cursos de graduação em ciências da religião, um movimento que não conseguimos acompanhar devido à sua amplitude. Inclusive nosso departamento tem o projeto, já aprovado, de criação de uma graduação em breve, dentro do programa de expansão das universidades federais.
Pessoalmente, considero este processo algo muito necessário para nosso ambiente brasileiro. Diz-se que o povo brasileiro é muito musical e religioso, entretanto, música e religião são disciplinas secundárias, na mente de algumas autoridades, para a formação de nossos cidadãos. Deste modo, não se desenvolve o conhecimento crítico destes temas. A musicalidade e a religiosidade ficam assim à mercê da exploração desenfreada, que muitas vezes não encontra a resistência necessária por ausência de uma formação reflexiva profunda.
Espero assim colaborar com alguns elementos que enriqueçam a reflexão nesta universidade, no sentido de um reconhecimento da importância não só imediata que tem a existência de cursos de ciências da religião, no sentido de formação de profissionais do ensino, mas de sua importância mais ampla para uma mudança de perspectiva a respeito da religião, de sua situação na sociedade e da auto-compreensão das personalidades que por ela são afetadas.
Atenciosamente,
Dr. Eduardo Gross - coordenador do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Religião da Universidade Federal de Juiz de Fora, MG

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